terça-feira, março 22

A REFUNDAÇÃO DA CIDADE


Por: Jeff Picanço

Cheguei em casa mas ainda não cheguei. Ainda estou agitado, inquieto, tenso. Paro um momento e me vem à cabeça imagens da tragédia que ainda paira sobre a nossa querida deitada-a-beira-do-mar. Foi tanta coisa, tanta historia e tanta lama, que vai ser difícil apagar as imagens da memória.

Nos últimos dois dias estive verificando áreas em Morretes e Paranaguá, nossas co-irmãs em historia, cultura e também na tragédia do 11 de março. Na área da Serra da Prata, ao sul da BR-277, a extensão dos deslizamentos de terra e a amplitude das enchentes também foi de assustar. O bairro Floresta foi praticamente arrasado por um fluxo de detritos que desceu cerca de 1 km até se depositar no sopé da serra, sepultando inúmeras propriedades. Inúmeros bairros na periferia de Morretes ainda têm fendas no solo e os taludes estão se movimentando, aumentando o risco de novas tragédias se a chuva voltar mais forte.

A conclusão a que chego é que a tragédia, apesar de toda sua extensão, ficou bem barata se contarmos o numero de mortos. No caso de Antonina o numero de mortos poderia ter sido bem maior, se não fosse os esforços da Defesa Civil antoninense, que na quinta feira acionou a defesa Civil estadual. Na sexta feira, os técnicos da MINEROPAR, acionados pela Defesa Civil, se pronunciaram pela desocupação das casas, o que evitou uma verdadeira catástrofe.

Vi a preocupação de pessoas com o fato de terem que deixar suas casas e irem para abrigos. Não é fácil, eu sei. Mas é necessário. É necessário que, diante da tragédia, tenhamos prudência a retornar as nossas casas. Dessa forma, muitas mortes podem ser evitadas.

Em breve, com o inicio do outono, a sol vai voltar e nosso solo ficará menos encharcado, e aí diminuem os perigos de novos desabamentos. Mas, é preciso deixar claro, ficarão inúmeras cicatrizes no solo. Como as nossas próprias cicatrizes, devemos nos acostumar e doravante conviver com elas. O dia seguinte numa terra castigada por semelhante catástrofe é de prudência e calma.

Devemos retomar nossas casas e nossas vidas, mas nada será como antes. Teremos que observar melhor os sinais da natureza e estar atentos para evitar que estas catástrofes, no futuro, cobrem um preço menor em vidas e bens. Isso exige muito esforço, método e recursos.

Temos que ter planos de evacuação em tempos de catástrofes. Temos que ter um mapeamento das zonas de risco geológico. Temos que ter um novo Plano diretor, que possa atualizar as posturas municipais e que evite a ocupação de áreas de risco. E, principalmente, temos que educar nossa população para entender o que passou e preparar melhor o futuro. Temos que ter casas melhores, um sistema de esgoto que funcione, temos que abandonar hábitos como jogar lixo nos rios e nas encostas, fazer cortes desnecessários em morros, cuidar da drenagem pluvial.

O nosso Serviço Público Municipal, que tanto se esforçou durante a tragédia, também tem que ser melhorado. Vi a prefeitura e seus funcionários trabalhando até a exaustão, acima de suas forças as vezes, pra fazer frente à tragédia. No entanto, nos dias que virão, não basta boa vontade, é preciso mais planejamento e estratégias de longo prazo.

Antonina precisa ser refundada. Nós, que discutimos tanto as datas de fundação da cidade, temos mais uma: 11 de março de 2011. Nesta data, varrida por uma chuva de dimensões quase bíblicas, a cidade teve que se esforçar pra se reerguer das cinzas. Contra a forca dos elementos, lutamos a principio pra permanecermos vivos. A luta, agora, é pra refazer, e refazer melhor. Esta crise é também uma grande oportunidade que o poder público tem pra fazer coisas que nunca puderam ser feitas. Cabe ao poder publico e à sociedade esta tarefa de refundação. Agora, no começo do século XXI, podemos fazer isso de forma transparente, democrática e inclusiva.

Valle Porto somos nós.

PS – agradeço profundamente ao Claudio topógrafo, à Erly Ricci, ao Paulinho Broska, ao Luis Capim Seco e a meu querido José Paulo Azim pela ajuda que gentilmente me prestaram nesses dias tão cinzentos e nublados de nossa querida Antonina.

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